segunda-feira, 28 de março de 2011

A Cruz

Por que é que um instrumento de morte se tornou no símbolo do cristianismo?
Ao longo deste tempo da Quaresma os jovens do 11º ano estão a fazer uma reflexão acerca do valor da Vida Humana. No passado sábado baseamo-nos no símbolo da Cruz para falar da dicotomia morte/vida.
No final desta reflexão "demos vida" à nossa própria Cruz, com a construção de uma Cruz feita de materiais recicláveis.

A morte é o maior enigma da condição humana. Tudo o que construímos durante longos anos, tudo o que é belo na existência humana, parece desvanecer-se em fumo no espaço de um instante. E eis que no coração da fé cristã encontramos o símbolo de uma morte violenta. Na companhia de Cristo, então, morrer pode tornar-se uma linguagem capaz de exprimir o dom total de si mesmo. Pela sua existência, Jesus ensina-nos «a lei do grão de trigo»: «se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto» (João 12,24). Esta «lei» não se aplica apenas à morte física. Indica antes que o caminho para a Vida passa inevitavelmente por soltar amarras, renunciar a agarrarmo-nos a todo o custo às nossas posses, a fim de irmos com Deus em direcção ao inesperado que se encontra à nossa frente. Em nós, está essa semente portadora de vida que subsiste e que floresce apesar de tudo. Neste sentido, a primeira «morte» que conhecemos é o nosso nascimento, onde abandonamos o abrigo do seio materno para enfrentar os rigores da existência. Depois, na história santa, temos o exemplo de Abraão, chamado a deixar para trás um mundo conhecido para embarcar numa aventura com o Senhor (ver Génesis 12,1-4). Mais tarde, encontramos o exemplo do povo de Israel, que tem de atravessar as provações do deserto para chegar à Terra prometida. A cruz é assim a revelação plena do verdadeiro movimento da vida: «Quem procurar salvaguardar a sua vida, perdê-la-á, e quem a perder, conservá-la-á» (Lucas 17,33). Na frase «Cristo também sofreu por vós» (1 Pedro 2,21), por exemplo, é «por vós» que exprime o meio termo, a presença do amor. No seu Filho, Deus desposou a condição humana ao ponto de tomar o último lugar por amor; a cruz é assim a expressão de uma solidariedade absoluta (ver Filipenses 2,6-8). E quando São Paulo escreve que partilha os sofrimentos de Cristo (por exemplo 2 Coríntios 1,5; Filipenses 3,10; Colossenses 1,24), exprime na realidade o seu desejo, no seguimento de Jesus, de se gastar pelos outros sem medida. Porque Cristo tomou sobre ele os sofrimentos da nossa condição por amor, esses sofrimentos podem ser vividos não já como um castigo merecido ou um destino cego e absurdo, mas como um encontro com o Amor e um caminho em direcção à Vida.
A cruz de Cristo revela-nos uma maneira de morrer que não contradiz a lógica da vida. A partir daí compreendemos que a cruz e a ressurreição são as duas faces, a face sombria e a face luminosa, de um só e mesmo Amor, de uma só e mesma Vida.

In Carta de Taizé, Março de 2004

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